Estudantes encapuzados espalham temor na USP |
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Denis Lerrer Rosenfield, doutor pela Universidade de Paris 1, professor titular de filosofia da Universidade Federal do Rio Grande do Sul e editor da revista "Filosofia Política", descreveu e analisou dia 1.º, em artigo publicado na seção "Tendências / Debates" da Folha de S. Paulo, a reprodução de "ações próprias do crime organizado" acontecida em plena reunião da Congregação do Instituto de Física da USP. Segundo ele, "um grupo encapuzado de estudantes" invadiu o recinto para retomar "práticas características dos partidos totalitários de esquerda ou de direita". Eis o que diz o artigo: "Um grupo de encapuzados invade uma sala onde se
realiza uma reunião. Os participantes, atônitos, presenciam um fato que
foge do seu alcance, pois uma tal violência abala qualquer pessoa
acostumada com formas pacíficas e normais de convivência. No momento em que vozes universitárias são assim silenciadas, coloca-se toda uma questão relativa ao exercício da autoridade. Não se pode, com efeito, |
considerar tais
práticas violentas como toleráveis, pois o limite da tolerância reside
nos princípios que tornam a tolerância possível -no caso, o uso da
razão. São intoleráveis práticas que destroem as condições mesmas da
liberdade e da democracia. Generaliza-se no país uma determinada postura que tem no desrespeito à lei um princípio de atuação, como se princípio fosse a eliminação de todo princípio. Nas universidades públicas federais, por exemplo, há um desrespeito sistemático à lei que estipula, nas eleições para reitor, a proporção de 70% para professores, 15% para estudantes e 15% para funcionários. Conselhos universitários pelo país afora deliberam sobre obedecer ou não à lei, freqüentemente não o fazendo. E o que fazem as autoridades universitárias e o Ministério da Educação diante de uma situação desse tipo? Convalidam as decisões tomadas, como se fosse uma prerrogativa da universidade obedecer ou não à lei! Uma instituição que deveria ser um modelo de atuação, que deveria oferecer à sociedade no seu conjunto um espelho de comportamentos exemplares, repete em seu universo o que já presenciamos na esfera macro do Estado brasileiro. Uma instituição que se caracteriza pela hierarquia do mérito e da competência se vê jogada em lutas desregradas pelo poder, inviabilizando, dessa maneira, o conhecimento que deve produzir. O que se passa "intramuros" tende a não ultrapassar as barreiras de uma instituição infelizmente cada vez mais voltada para si mesma, quando, paradoxalmente, os seus problemas são os da sociedade em seu conjunto, quando mais não seja porque se trata de recursos públicos, dos contribuintes. O inédito nesse caso é que um grupo de professores titulares do Instituto de Física da USP decidiu se manifestar, mostrando a sua indignação, reclamando providências e mostrando-se disposto a uma discussão pública. Há esperança quando vozes não se calam. Contudo o que não se viu até agora foi uma manifestação pública das autoridades universitárias, que têm em suas mãos instrumentos que podem tanto punir os responsáveis por tais atos de violência, quanto impedir que esses atos se repitam no futuro. A complacência com a violência em nome da concórdia ou outro valor do mesmo tipo traz consigo o germe de atos semelhantes, enfraquecendo a legítima autoridade e criando condições para o estabelecimento de formas violentas de exercício do poder. A falta de autoridade abre caminho para outras formas de autoritarismo." |